Nestas vinte e oito histórias, tão breves como envolventes, lembramos lugares, pessoas e encontros que deixaram uma impressão indelével em John Berger: Henri Cartier- -Bresson no metro de Paris, os gestos demorados de um estranho no café, uma travessia de ferry no Mediterrâneo, as palavras sussurradas por um prisioneiro, Barcelona a derreter ao sol de Verão — amigos e caminhantes com quem o autor se cruzou pelo mundo, pintando um fresco comovente da paisagem humana no fim do milénio. Imitando o fotógrafo com a sua câmara, John Berger segue, com palavras, «o impulso espontâneo de uma atenção visual perpétua, que capta o instante e a sua eternidade». Fotocópias (1996) — tiradas a algo que não nos pertence, a um original efémero ameaçado pela passagem do tempo, mas cuja imagem queremos conservar e recordar — captura com sensibilidade o que é fugaz, flashes ou revelações do trivial extraordinário, eternizando-os na página.
John Berger (1926-2017), crítico de arte, pintor e escritor inglês, ícone da contracultura e um dos pensadores mais influentes dos nossos dias, avançou contra a corrente num tempo de especialistas e especializações. Em quadros, ensaios, poemas, ficções, argumentos para cinema ou programas de televisão, foi plural também nas suas inspirações, tomando interesse nas franjas da sociedade (os presos, os camponeses, os migrantes) como exemplos de resistência em face da ignomínia de governos e mercados. Foi para escapar a essa infâmia, aliás, que Berger se exilou durante mais de 50 anos na França rural. Ganhou o Prémio Booker em 1972 com o seu romance experimental feminista G., e o seu ensaio mais famoso, Modos de Ver, escrito nesse ano após o êxito retumbante da série homónima da BBC, é uma referência na crítica de arte ainda hoje estudada por académicos e redescoberta pelo público. Com um olhar curioso sobre o mundo, com os pés assentes na terra e as mãos a revolvê-la, soube como poucos expor, ao longo da obra e da vida, as suas convicções políticas, contradições e metamorfoses.
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